Novidades no agronegócio em tempos de COVID-19 – Patrimônio Rural em Afetação (PRA)

Em outro post (https://corelaw.com.br/agronegocio-pandemia), já havíamos falado sobre a Lei 13.986 de 7/4/2020, conversão da extinta MP do Agro (n.º 897/2019).

 

Uma de suas principais novidades é patrimônio rural em afetação (“PRA”).

 

Antes de falarmos do PRA, é importante voltar para a definição do patrimônio de afetação (“PA”). No mercado imobiliário urbano, o PA é bem conhecido e a própria lei de incorporações (Lei n.º 4.591/64, com as alterações da Lei n.º 10.931/04) o define como um patrimônio separado da incorporadora – o terreno e as acessões objeto de uma específica incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados – que fica destinado “…à consecução da incorporação correspondente à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes”. Ou seja, segrega-se parte do patrimônio da incorporadora exatamente para que esta possa cumprir com as suas obrigações; proteção para o credor (adquirente da unidade, no caso), portanto.

 

Adaptando este conceito, a nova Lei criou um patrimônio de afetação sobre os imóveis rurais que possibilita ao produtor rural segregar de seu patrimônio aqueles imóveis ou parte deles para garantir operações de financiamento realizados por meio da Cédula Imobiliária Rural (CIR) ou da Cédula de Produto Rural (CPR).

 

Proteção para o credor, novamente, pois “…os bens e os direitos integrantes do patrimônio rural em afetação não se comunicam com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do proprietário ou de outros patrimônios rurais em afetação por ele constituídos, nas seguintes condições: I – desde que vinculado o patrimônio rural em afetação a CIR ou a CPR; II – na medida das garantias expressas na CIR ou na CPR a ele vinculadas.”

 

O PRA inclusive não é atingido pelos efeitos da recuperação, insolvência ou falência. Mais uma vez, forte garantia ao credor.

 

Porém, segundo a exposição de motivos da MP e da Lei isso reduziria custos operacionais, esse procedimento simplificaria e ampliaria o acesso aos recursos financeiros pelos proprietários de imóveis rurais, melhorando até as condições de negociação nos financiamentos rurais e a qualidade das garantias oferecidas pelos produtores rurais, e ainda: “…o proprietário de imóvel rural poderá apartar seu imóvel rural, ou fração deste, compreendendo o terreno, bem como acessões e benfeitorias nele fixadas, do restante de seu patrimônio, utilizando-o para garantir financiamento junto ao mercado financeiro”.

 

E é exatamente nesse ponto da fração do imóvel que entra a complicação. A dor do proprietário rural sempre foi a seguinte: como dar um imóvel em garantia que vale R$ 10.000.000,00 para uma dívida de R$ 200.000,00? Os bancos sempre tiveram um excesso de garantia e raríssimas vezes aceitavam não tomar o bem imóvel inteiro em garantia de alienação fiduciária, travando totalmente o patrimônio do proprietário rural.

 

E esse novo procedimento – a ser autuado e registrado no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição a que pertence o imóvel a pedido do proprietário rural – pode aliviar o proprietário rural? Da maneira com que está posta a lei, não.

 

Ora, se um banco pode pegar todo o imóvel (como no exemplo acima), por que haveria de aceitar uma diminuição de sua garantia? Lembre-se que os bancos há tempos aboliram a hipoteca e usam (em sua grande maioria) a alienação fiduciária. Por qual razão o proprietário rural teria de repente e com essa nova lei agora força maior de negociação perante a instituição financeira? Só existe uma regra de ouro no capitalismo: “quem tem o ouro é quem faz a regra”.

 

Afora isso, há uma série de dificuldades impostas pela para que o proprietário rural consiga o PRA na matrícula de seu imóvel (futuro desdobro / desmembramento, com necessidade de memorial descritivo, planta e quem sabe – ainda não regulamentado – o georreferenciamento novo da área) e depois na execução da garantia (não tendo o proprietário rural feito o memorial e planta georreferenciada, será o banco o responsável por essas providências para correr com os trâmites da alienação fiduciária? Ou então, será o arrematante quem irá ter que fazê-lo? Será que este terá uma copropriedade com o proprietário rural e, finalmente, terá que entrar com a ação de extinção de condomínio para ficar dono sozinho de sua parte?

 

Enfim, a lei traz mais dúvidas vez que parece ter esquecido completamente de nosso ordenamento jurídico.

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Roberto Cunha